terça-feira, 8 de março de 2011

Luzes que se apagam.

Querida Anne,

Eu não quero mais sentir. Está cada vez mais difícil respirar o ar dessa cidade estranha, mesmo me enxendo com todas a pílulas possíveis e bebendo todo o álcool das prateleira visíveis. Me sinto envenenado, condenado a passar uma vida miserável, autodestrutiva, apenas para suprir meus pecados.

Eu caio, não consigo mais levantar.

A gravidade desse planeta é mais do que posso suportar. O peso nas minhas costas não ajuda, é como se todos os problemas se revertessem em alteres de ouro e prata pendurados em ganchos que perfuram minhas costelas e me jogam pra baixo.

Amar você tem sido mais complicado do que viver sob essas condições. Chega a doer em certos momentos. É difícil, é mortal. Não entendo esse jogo de pingue-pongue em que nos metemos: sempre em trânsito, de um lado a outro, cruzando a linha imaginária da felicidade e da mais profunda agonia; do ódio e do amor; do certo e do errado.

Só sei que me encontro terrívelmente apaixonado por você, mesmo com todas as merdas que acontecem e com todos os osbstáculos. Só sei que você é o que mais se parece com um lar, no momento, para mim. Só sei que eu não quero ir embora agora.

No entanto, enquanto corro para te encontrar, sinto que você continua, ainda, tão distante no meu horizonte. Uma miragem. Cervejas e cigarros não tem sido o bastante pra aliviar minha condição crônica. Deitar em tantas camas diferentes com tantas mulheres estranhas também não tem ajudado. Sinto-me perdido. Sem rumo.

Tudo que eu quero é seu sorriso, deitar em nossa cama. Me sentir em casa.

Tudo que consigo, por outro lado, são luzes apagando, dando lugar a escuridão.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Acordar sem você.

 

Acordei ainda meio atordoado com tudo que se passou noite passada. Seu cheiro continua em mim, impregnado. Quase, ainda, posso sentir seu calor em meus lençóis, ou isso é apenas o que eu desejo nesse momento.

Algumas garrafas de cerveja pelo chão, várias derrubadas, formando poças, manchando os carpetes em que costumávamos nos deitar, você, com seu cigarro pendendo dócilmente da boca, com a bituca manchada com um batom cor-de-vrinho; e eu, um bobo sorridente, com uma garrafa de Heineken na mão, ainda ofegante, olhando para o seu rosto cuidadosamente expressivo que me dizia “eu quero você cada vez mais!”. As marcas nas minhas costas são a prova do teu desejo, quase vital, por mim.

Seguindo uma trilha de cinzas posso entender que você saiu porta à fora. Você disse que o faria, eu aceito. Alguém aqui tem que trabalhar, crescer na vida, ou pelo menos, crescer mentalmente.

Acendi um cigarro dela… reserva especial. Como um pedaço de carne das sobras da noite passada e abro uma cerveja gelada, colocando-a ao alcance de minha mão esquerda. O cigarro queima, com seus minutos de vida contados, num cinzeiro em forma de pato. Na minha frente, meu computador, onde, nesse momento, digito furiosamente palavras que vão compor meu próximo livro.

Sim, eu sou sou um escritor.

Não, não faço tanto sucesso.

Eu sou daquele tipo de cara old school que senta o traseiro de frente ao teclado e digita durante dias à fio, aproveitando um súbito momento de criatividade. Esse é um deles.

As palavras parecem brotar em minha mente, me sinto bem…

Talvez seja a fumaça do cigarro. Me lembra ela.

Falando nela, meu telefone celular vibra. Mensagem recebida. Leio: “Saindo do trabalho, chego já em casa! Estou com saudades, baby!”.

Tomo mais um gole da minha cerveja enquanto penso nas minhas próximas palavras. Um trago do cigarro dela.

“Toda manhã tenho a sensação que ela me deixa e eu acordo numa cama imensa com o cheiro dela, porém vazia…”, escrevi em meu teclado, com o cigarro pendurado no canto da boca.

KNOCK, KNOCK!

Perdi a noção do tempo, ela está de volta, provavelmente. Ando até a porta. Passos silenciosos. Olho mágico. É realmente ela.

Dá pra sentir seu perfume subindo pela fresta da porta. Ela é realmente linda.

KNOCK, KNOCK!

Ela está segurando alguma coisa em suas mãos. Está embrulhado em papel de presente.

KNOCK, KNOCK!

KNOCK, KNOCK!

KNOCK, KNOCK!

Estou sentado no chão, com as mãos na cabeça, encostado na porta e ouvindo ela gritar desesperada. Ela chora. Ela sabe que estou ali do outro lado. Ela pede que eu por favor pare com isso, que a deixe entrar. Ela urra que me ama. Promete o céu à mim.

Finalmente cansa.

Ouço passos descendo as escadas do prédio e um choro estridente.

A garrafa vazia de Heineken serve de cinzeiro para o último cigarro. Levanto e abro a porta. O presente estava ali em frente a ela. O levo até a mesa da sala e abro: um bolo. Escrito com glacê, em cima: “Um ano perfeito!”.

Tiro um pedaço, com as mãos mesmo, e pego outra cerveja. Ponho novamente ao lado do computador. Limpo a sujeira do bolo no calção de nylon.

Respiro fundo.

As palavras surgem diante da tela, lentamente: “…mas na realidade, sou eu quem a deixo, com medo de amá-la ainda mais e perdê-la de qualquer forma.”

Salvo o texto.

Seguro o notebook com as duas mãos. Olho para ele por alguns segundos.

Finalmente acabei.

O arremesso pela janela aberta.