Todos nós nascemos enjaulados. Presos em um reduzido espaço fortemente guardado. De nossas jaulas podemos enxergar apenas outras jaulas, em filas intermináveis da mais profunda reclusão. Sob a luz do sol e da lua, trabalhamos arduamente para manter acesa a chama da liberdade...
Afinal, vivemos uma vida restrita, com uma rotina onde até mesmo a quebra do script tem de ser minunciosamente arquitetada. Um passo fora da linha em direção ao exterior e logo somos atirados de volta às jaulas, surrados e postos novamente em nossos devidos lugares.
Não devemos pensar. Não devemos querer. Não devemos sentir. Somos seres frios, racionais. A lógica da sobrevivência impede o movimento em direção ao verdadeiro amor, à verdadeira amizade, a um sorriso sincero. Em contrapartida, nosso grande cativeiro fica envolto às disputas entre o gênero (des) humano. Medo, rancor, inveja, ódio, desespero, guerra e sofrimento... Dor. São palavras do cotidiano, imersas em ações de terceiros que, indubitavelmente, se importam com algo: o próprio nariz, salvar a própria pele, passando por cima dos outros e estabelecendo suas próprias regras tolas de conduta, que só servem para aprisionar muitos em novas jaulas.
Os poucos que se arriscam abrindo os olhos e deixando os sentidos se manifestarem encontram-se em desespero, na beirada da falésia da loucura. Os tons de cinza do céu e o constante clima escuro da morte que espreita a todos nós. E aquele cheiro! Os odores de nossas próprias porcarias que emanam de nossos corpos, de nossas respirações. De nossos corpos em pleno processo de decomposição involuntária. Tudo isto complementado com uma trilha sonora bastante humana: gritos. Desespero, dor, arrependimento, ciúmes, ódio...
Ah... A tão sonhada liberdade...!
Será que alguém chegou a alcança-la de verdade? Será um mito, uma utopia? Um conto de fadas, talvez?
Bem, ninguém nunca passou caminhando pelo meu cárcere e me contou as maravilhas do lado de fora dessa prisão.
No entanto, ainda está em tempo de aproveitar esses últimos resquícios de sanidade e ir a busca desse sonho. Não adianta me segurar pelas pernas, pelos braços... Eu escaparei, nem que seja mordendo as grades, cabeceando-as, até que se corroam, que cedam. Escaparei da minha velha jaula enferrujada.
Sei que não há volta.
Só espero que o lado de fora não seja uma loucura maior, que me faça perceber que eu estava mais seguro do lado de dentro...